domingo, 27 de janeiro de 2013

Pouco do que presta

O que resta do meu gosto
é o gosto da tua língua
misturada a minha pele,
o resto

da tua saliva enquanto roubava
o gosto do meu corpo,
lavado à língua,
à pressa,

A sobra do gozo
do teu gosto,
no meu rosto,
Só reza.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Origami


Uma coleção não guarda valor de singularidade. Um quadro numa parede é maior que uma parede de quadros. A unicidade escancara. A coletividade desdobra.
Uma carta de amor acabado é um artefato, várias cartas de amor acabado são uma coleção.

Outra coisa


Mesmo diante de minhas próprias cartas de amor acabado, sou outro. As cartas de amor acabado se exibem, são exibidas,
Me pertencem sem me pertencerem mais.
Uma restância que traça um rastro sem memória. Não há memória nas cartas de amor acabado. Não lembro como amei, como pude. Quando deixei de amar, perdi o retorno. Meu passo, não acredito que pisei.

(Bibliotecas são fortalezas que protegem os homens dos livros)


Colecionar um desejo de se perpetuar
Apropriar o objeto, apassivá-lo na coleção,
carregá-lo com o meu pertencimento,
meu nome grafado na multiplicidade infligida aos seres

Perversidade dos zoológicos, detentos enumerados.
Freud em sua mesa, rodeado de coleções.
Freud em minha estante. 6-7 volumes.

Discordância


Já as cartas de amor são correspondência
- mesmo que sem resposta - As cartas de amor são do corriqueiro, da vida-a-vida. Bilhetes na porta da geladeira, emails no meio do trabalho, cartão postal a quem volta. As cartas de amor se perdem. As cartas de amor são tesouro esquentando a barriga de dragões gulosos – mesmo que você ache que não.

Deriva

De amemos
que o sabor seja amor
que haja textura no amargo
que o amargo se desdobre num espectro
que encerra as camadas de doce
onde trai sua inocência
de onde é cúmplice do amargo
hipócrita doce, sedutor doce
mentiroso doce, ingênuo doce
tolo doce, que cede ao amargo
do amor o gosto amargo
de almas ao mar
de ao menos.