Tenho, antes que anoiteça, ao menos tinha até agora pouco essa vontade louca de casar com Marcelo. Queria mesmo. Queria logo daqui a pouco, nessas próximas horas de sol com esse céu azul bem azul desse jeito que ele está. Queria a ponto de sentir a textura da toalha branca estendida na mesa de madeira clara da mãe dele, no meio do jardim que dá pros fundos. Queria a ponto de ver o vinho escorrer pela borda dos copos e formar circulos na toalha branco perolada que só se segura do vento por causa dessas taças finas. Queria a ponto de sentir a luz entre as árvores antes de qualquer um poder entrar para me contar o quanto essa bobagem toda é homo demais, bicha até pra mim, antes de qualquer um interromper o "sim".
Quando Marcelo me pediu em casamento estávamos saindo da exposição dos gordinhos colombianos. Tantos gordinhos, tanta tristeza. E, ao mesmo tempo, uma felicidade naquela gordura, uma felicidade assim gostosa engordurada. Deve ser bom ser gordinho e oleoso e engordurado assim. Deve ser bom casar com Marcelo e passar essas tardes engorduradas em galerias, comendo torradas com tomate picado com manjericão por cima e engordar e engordar e engordar. Deve ser bom não passar base nas olheiras todas as manhãs, deve ser. E usar uma daquelas roupas coloridas. Meu deus. Usar um poncho. Será que Marcelo me daria um poncho? Eu queria amar Marcelo e amar um poncho e não amar tanto meu cabelo. O fato é que Marcelo está ficando careca. Não vou dizer isso a ele, é claro. É cruel. Mas é muito triste porque ele não sabe. Talvez fosse menos triste se ele soubesse. Existe uma certa dignidade em saber que se vai ficar careca e sofrer por isso.