Uma coleção não guarda valor de singularidade. Um quadro
numa parede é maior que uma parede de quadros. A unicidade escancara. A
coletividade desdobra.
Uma carta de amor acabado é um artefato, várias cartas de
amor acabado são uma coleção.
Mesmo diante de minhas próprias cartas de amor acabado, sou
outro. As cartas de amor acabado se exibem, são exibidas,
Me pertencem sem me pertencerem mais.
Uma restância que traça um rastro sem memória. Não há
memória nas cartas de amor acabado. Não lembro como amei, como pude. Quando
deixei de amar, perdi o retorno. Meu passo, não acredito que pisei.
- mesmo que sem resposta - As cartas de amor são do
corriqueiro, da vida-a-vida. Bilhetes na porta da geladeira, emails no meio do
trabalho, cartão postal a quem volta. As cartas de amor se perdem. As cartas de
amor são tesouro esquentando a barriga de dragões gulosos – mesmo que você ache
que não.
De amemos
que o sabor seja amor
que haja textura no amargo
que o amargo se desdobre num espectro
que encerra as camadas de doce
onde trai sua inocência
de onde é cúmplice do amargo
hipócrita doce, sedutor doce
mentiroso doce, ingênuo doce
tolo doce, que cede ao amargo
do amor o gosto amargo
de almas ao mar
de ao menos.