sábado, 18 de maio de 2013

Crônica da Pólvora IV

Numa noite inesperada cheguei ao prédio de J. e disquei seu número do orelhão da rua. Não achei que ele fosse atender, era muito tarde. Mas a luz do seu apartamento acendeu e ouvi sua voz sonolenta depois do clic. Quando atravessei o umbral da porta, me dei conta de mim no olhar pasmo que ele me lançou. Eu fedia a cigarro e cachaça. Enquanto a água do chuveiro esquentava e caía desperdiçada no chão, minha voz tropeçava na língua e nas roupas e as explicações se perdiam. É como as baleias, lembro de ter dito. Elas voltam para a praia onde o caçador vai descansar o arpão. Elas vão morrer na praia, mas isso não tem nada a ver com não conseguir mais nadar. Elas precisam mostrar ao caçador a ferida que ele fez. Olha, eu sangro. É o que as baleias dizem.

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